Wednesday, August 21, 2013

Primeiro Alcibíades

Se eu fosse apontar uma unidade das postagens até o momento nesse blog, eu diria que estou peneirando uma série de pequenos livros, de fácil leitura e que podem mudar a perspectiva de vida de uma pessoa. Bom, esse pequeno diálogo platônico compartilha em muitos sentidos essa mesma estrutura com algumas outras obras aqui já citadas. 

O platonista Thomas Taylor, em sua Introdução à Filosofia Platônica recomenda que essa obra seja a primeira obra que alguém que pretende estudar a obra de Platão deveria ler.  E realmente uns três ou quatro temas gerais que são desenvolvidos posteriormente em outros diálogos estão já aqui delineados bem como o método geral também  está,  de forma que é de fato um bom livro introdutório segundo eu vejo.

Alcibíades, que dá nome ao diálogo, é um jovem homem que possui quase todos os bens externos que alguém poderia almejar no contexto da pólis grega (juventude, beleza, riqueza, amizades, etc.) e que está em busca agora do poder político. O diálogo se inicia girando em torno das questões das competências necessárias para a vida política. Através da sua conhecida escalada conceitual e direcionando Alcibíades a uma reflexão interior, Sócrates vai destruindo os pressupostos do jovem pretenso político e desvelando suas falsas expectativas de conhecer o conceito de Justiça e até mesmo o conceito de Amor com propriedade.

É de se notar que Alcibíades tivera interesse não correspondido por Sócrates, como pode ser visto em episódio do Banquete, e na ocasião desse diálogo, o filósofo usa esse vínculo pessoal também como mais um elemento no impulso "centrífugo" da retirada da atenção das coisas externas para alma, e ele o faz mostrando a superioridade o amor da alma, em relação ao amor dos corpos. Sócrates se apresente então como o único amante legítimo e fiel de Alcibíades, pois ele amava sua alma, que era permanente, e que esse amor não poderia acabar nunca (eu li em algum lugar que foi desse diálogo que se originou o termo 'amor platônico', mas não confirmei isso).

O ápice do diálogo é, no entanto, a apresentação do famoso adágio "conhece a ti mesmo", que é o ponto de apoio ou alavanca de grande parte da filosofia platônica. Vimos anteriormente no compêndio da auto-investigação do hindu Ramana Maharshi a abordagem negativa; pois sim, esse diálogo também é uma investigação negativa do "eu verdadeiro" à sua maneira. Sócrates demonstra, através de raciocínios, que o "ti mesmo" ao qual se refere o Oráculo, não é o corpo, pois o corpo é uma posse do "eu", e tampouco são objetos externos.

Na busca pela perfeição e pela virtude, o modelo mais imediato é o contato com a alma de um homem virtuoso, da mesma forma que o olho vê a si mesmo no olho de outro, a alma vê a si mesma refletida em uma outra alma virtuosa; No entanto, em última instância, essa investigação desemboca, nos termos do próprio diálogo, no reconhecimento do Deus como a via para sair dessa "situação lastimável" de escravidão, que é a vida do homem não virtuoso.

Alcibíades, que no início do diálogo era um homem que pretendia conhecer a justiça e ser qualificado para exercer a função pública, reconhece suas limitações e se coloca sob a instrução de Sócrates, que faz uma observação ainda sobre o poder corruptor da política,  que consegue às vezes desvirtuar até mesmo as almas que aspiram à virtude e à nobreza.