Saturday, January 9, 2016

Discípulos da Prakrti

[...] Há também outro tipo de pessoa que pensa que um homem nunca poderia ser discípulo de outro ser humano, e que, portanto o guru é somente Deus, de maneira que obedecer a Deus significa seguir os ensinamentos [naturais] que Ele nos dita diretamente à inteligência e ao coração. 

Essas pessoas consideram que a Natureza (Prakrti) é o Guru Supremo. 

Montanhas, árvores, bosques, nuvens, trovões, risos, mares e lagos seriam mestres segundo eles. Mas nós reafirmamos que uma sociedade de seres humanos com consciência não pode ser construída pela ajuda de coisas inconscientes. 

A Natureza por si mesma pode ser o Guru de árvores, trepadeiras, pássaros e bestas, mas nunca do homem. Assim que a vaca dá luz ao bezerro, este se levanta e busca sua mãe segundo a lei da Natureza (Pakriti); mas no caso de um bebê humano, a mãe em sua amorosidade tem de esquecer as dores do parto, e com sua mão segurar o seio na boca do bebê, pois de outra maneira o desejo da criança não vai ser saciado.[...] 

Os praticantes espirituais deveriam entender que as mesmas pessoas que rejeitam o guru humano, se fossem jogadas em um tanque de água [sem que ninguém as tenha ensinado a nadar] se afogariam. E são esses mesmos que querem cruzar o oceano da existência dez vezes a cada meia hora em nome do Guru da Inteligência Natural, e não só fazem isso como chamam outros para irem junto com eles. 

Se o seu desejo de imitar pássaros e animais pudesse ser sincero, então, ó discípulo da Natureza! seu corpo seria igual o deles. Na verdade, você não entende a Prakrti, apesar de se dizer um discípulo dela. É uma pena. 

Ora, qual é o indivíduo nesse universo que não é um discípulo da Prakrti? Desde o surgimento do indivíduo até sua reabsorção no Parabrahman todas a faculdades e atos do corpo, da fala e da mente são reguladas segundo as leis da Prakrti. Portanto, não é nem sinal de inteligência, e nem é um ensinamento das Escrituras, sair por aí dizendo que faculdades naturais como comer, beber, ou ter o instinto de medo ou de copular são as únicas governadas pela Prakrti. 

O próprio Bhaga­van disse a Arjuna: "os indivíduos seguem sua natureza (Prakrti) individual". Então como é que alguém iria suprimir isso? A pessoa nasce em uma determinada casta de acordo com os decretos dos deuses e os frutos das existências anteriores. É por isso que as suas conquistas espirituais (siddhis) só podem ser obtidas através da linha discipular (Achara) e do mantra no qual a Prakrti o iniciou. As escrituras dizem que aquele ao qual a Prakrti dispôs como um bramâne (potencialmente) deve atingir a união com Deus através da linha discipular (Achara) dos brâmanes. Olhando as coisas de forma tosca, é impossível, por exemplo, transformar um animal em um homem, e, portanto, é impossível converter um chandala em um brâmane (pela lei da Prakrti).

Se a Prakrti abandonasse o indivíduo logo depois de seu nascimento, talvez fosse possível algum dia mudar a casta do indivíduo. Mas se a própria Prakrti não liberta o indivíduo, mas ao contrário, a relação com Ela permanece até o momento que precede à libertação, não é possível esquivar-se de Seu jugo. De acordo com a própria lei do "Guru Natural" (Guru Prakrti), uma colina ou uma montanha, que são inconscientes (acit) nunca poderiam ser guru de um homem consciente (cit), e assim tomar o lugar de um outro ser humano consciente [na transmissão do ensinamento]. 

Mas é um estranho capricho, e um capricho que vem da própria Prakrti, que um ser humano chegue a se sentir envergonhado ou constrangido em chamar outro ser humano de guru, mas que não se sinta envergonhado de maneira alguma em chamar coisas inconscientes de gurus. 


Princípios do Tantra, Shriyukta Shivachandra Vidyarnava (Tradução Livre)